A Voz da Liberdade e a Luta Jurídica Contra a Escravidão no Brasil Imperial

Luiz Gama foi um dos mais notáveis cérebros jurídicos do Brasil no Século XIX. Luiz Gama nasceu em 21 de junho de 1830, filho de Luiza Mahin, uma mulher negra e possivelmente livre, ativista da luta pela liberdade dos escravizados. Já sobre o pai de Luiz Gama pouco se sabe, Gama nunca mencionou se quer o nome dele. O que se sabe é que era um homem branco de família abastado. Era conhecido como um fidalgo.

Em 1835 durante a Revolta dos Malês, que foi um dos mais significativos levantes de resistência à escravidão no Brasil, liderados por africanos escravizados e libertos, sua mãe desapareceu e nunca se teve mais notícias sobre seu paradeiro. Alguns autores defendem a tese de que foi deportada.

Por volta de 1840, aos dez anos, Luiz Gama foi vendido como escravo pelo próprio pai depois de conhecer a falência. Esse episódio marcou profundamente sua vida e influenciou sua luta incansável contra a escravidão. Gama chegou em São Paulo, onde viveu como escravizado até os 17 anos.

Gama conheceu Antônio Rodrigues do Prado Junior que lhe apresentou o maravilhoso mundo das letras.

Gama era autodidata, aprendeu a ler e escrever e incentivado pelo amigo tomou conhecimento das leis. Gama conseguiu o documento que comprovava sua condição de liberdade. Armado com a carta ele foi até o seu “dono” e apresentou a prova de sua liberdade. Primeiramente, Gama se inscreveu na Faculdade de Medicina de São Paulo para estudar Farmácia. Embora aprovado na Faculdade, não conseguiu concluir o curso devido à sua condição financeira.

Em 1854 Luiz Gama conheceu o Delegado Francisco Jose de Lima, com quem trabalhou como ajudante até 1857. Durante esse período teve a oportunidade de se aprofundar no conhecimento sobre o sistema jurídico e político, o que foi fundamental para sua futura atuação como advogado. Foi uma etapa importante no processo de aprendizado e na construção da carreira que o tornaria um dos maiores abolicionistas do Brasil.

Luiz Gama atuava como “rábula”, termo utilizado para se referir a alguém que exerce advocacia sem o diploma formal de Direito, podendo atuar somente na primeira instância. Gama se tornou um grande advogado autodidata, utilizando seu vasto conhecimento das leis adquirido por meio de leitura e experiência prática. Gama defendeu a tese de que o escravo ao matar seu senhor age em legítima defesa. Essa tese tem uma base filosófica e legal que questiona a legitimidade da escravidão, ao mesmo tempo que afirma a condição de violência sistemática e opressão sob a qual os escravizados viviam. Luiz Gama argumentou que, para um escravizado, a constante violência e humilhação a que era submetido configuravam uma situação de defesa legítima. Em termos jurídicos, a defesa legítima ocorre quando alguém utiliza de força para proteger sua vida ou evitar um mal iminente e injustiça.

Gama defende que, num contexto onde o escravizado era ameaçado constantemente, espancado, e submetido à violência física e psicológica, o ato de matar um senhor poderia ser justificado como uma ocorrência em defesa própria. Ele considerou que o escravizado estava de fato em uma defesa de sua própria vida e dignidade, já que o ambiente de violência constante o colocava em uma situação de risco permanente. A tese de Gama teve grande importância para a defesa dos escravizados nos tribunais da época, mesmo sendo considerado um rábula Gama conseguiu usar sua habilidade jurídica para libertar muitas pessoas e essa tese, embora não tenha sido formalmente reconhecida pelas autoridades ajudou a lançar luz sobre as graves injustiças do sistema escravocrata e a construir uma base argumentativa contra a escravidão.

Luiz Gama contribuiu para a construção do movimento abolicionista no Brasil. Ele desafiava as convenções jurídicas que favoreciam os senhores de escravos, buscando, assim, formas de justiça para aqueles que eram sistematicamente despojados de sua dignidade e liberdade. Luiz Gama faleceu prematuramente aos 55 anos no dia 24 de agosto de 1882, por complicações do diabetes causando grande comoção. O cortejo reunia a alta corte do Império, políticos, juízes, escravos e o povo.

Em 2015, a Ordem dos Advogados do Brasil de maneira histórica e tardia formalizou seu título de advogado.  A decisão da OAB foi uma forma de corrigir uma injustiça histórica e considerar o legado jurídico e abolicionista de Luiz Gama que libertou mais de 500 pessoas da escravidão.

Ronaldo Marques Rocha: Advogado e Brasilianista.

O termo “brasilianista” refere-se a estudiosos, pesquisadores e entusiastas que se dedicam ao estudo da história, cultura, política e sociedade do Brasil.

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