Uso exclusivo de imóvel da herança: dever de indenizar e responsabilidade pelo IPTU antes da partilha

É comum que, após o falecimento, um dos herdeiros passe a morar sozinho em um imóvel pertencente ao espólio. Enquanto isso, os demais herdeiros, sem acesso ao bem, aguardam a partilha sem usufruir da propriedade. Esse cenário, frequente, demanda atenção, pois o uso exclusivo de um bem comum gera consequências jurídicas importantes, envolvendo o dever de indenizar e o pagamento do IPTU.

Durante o processo de inventário, os bens deixados pelo falecido pertencem conjuntamente a todos os herdeiros. Assim, quando um deles ocupa um imóvel de forma exclusiva, os demais são privados do uso ou do rendimento que poderiam obter com esse bem. Esse desequilíbrio pode ser corrigido desde que o herdeiro prejudicado adote as medidas adequadas para cobrar indenização proporcional — geralmente por meio de aluguel.

Importante frisar que o direito à indenização não nasce automaticamente. É necessário formalizar a cobrança: o herdeiro que se sentir prejudicado pode notificar extrajudicialmente o outro, seja via cartório de Títulos e Documentos ou por carta registrada com aviso de recebimento (AR). Também é possível propor uma ação judicial de arbitramento de aluguel. A partir da notificação (ou da intimação no processo), o herdeiro que reside no imóvel passa a ter a obrigação de indenizar os demais mensalmente, enquanto durar a posse exclusiva. Ressalte-se que essa obrigação não retroage ao período anterior à notificação, mas pode ser iniciada mesmo antes da abertura do inventário, configurando inclusive um obstáculo à usucapião do bem pelo ocupante.

A responsabilidade termina quando o imóvel é desocupado ou, ao final da partilha, for atribuído exclusivamente ao herdeiro que o ocupava. Até lá, esse dever permanece e deve ser respeitado para evitar prejuízos aos demais herdeiros.

Nesse contexto, surge outra dúvida prática: e o IPTU? Quem deve arcar com essa despesa enquanto a partilha não é concluída? O entendimento recente da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é claro: o IPTU, assim como outras obrigações patrimoniais, é dívida do espólio. Isso significa que, mesmo que um herdeiro esteja pagando aluguel pelo uso exclusivo do imóvel, ele não pode ser obrigado a arcar também com o IPTU, salvo se houver acordo prévio e formal entre os herdeiros. Na ausência desse acordo, o IPTU permanece dívida do espólio, a ser paga com recursos do acervo hereditário.

Se esse herdeiro, que já paga aluguel, for compelido a pagar também o IPTU sem concordância prévia, haverá desequilíbrio, pois ele suportaria duas obrigações simultâneas — o uso do bem e o tributo — enquanto os demais herdeiros e o espólio permanecem isentos. Essa situação configura enriquecimento ilícito dos demais, e o valor não pode ser descontado automaticamente do quinhão do herdeiro que paga o aluguel.

Por outro lado, se outro herdeiro — que não reside no imóvel — assumir sozinho o pagamento do IPTU, ele somente poderá ser reembolsado se houver autorização judicial expressa no processo de inventário e comprovação documental do pagamento. Sem essa autorização e comprovação, qualquer tentativa de compensação direta não será reconhecida.

Essas situações exigem atenção prática e estratégia jurídica. O herdeiro que ocupa o imóvel deve estar ciente de que o uso exclusivo gera consequências legais — tanto quanto ao dever de indenizar quanto às limitações para o abatimento de despesas como o IPTU. Já os herdeiros que não usufruem do bem não precisam aceitar passivamente o prejuízo: é possível buscar compensação válida, desde que com provas e medidas adequadas.

Nesse contexto, a atuação do advogado é essencial para equilibrar interesses, prevenir conflitos e garantir que o patrimônio seja partilhado de forma justa. Cada detalhe importa: a forma como as cobranças são feitas, a documentação apresentada e o momento das providências influenciam diretamente a partilha do inventário e a proteção do quinhão de cada herdeiro.

Alexssandra Carolina – Advogada. Presidente da Comissão de Sucessões da OAB Divinópolis. Especializada em Direito das Sucessões e Planejamento Patrimonial, cujo objetivo é ajudar famílias e herdeiros a garantir um futuro seguro e tranquilo.

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